A derrota da prefeita Adriane Lopes e da secretária de Saúde Rosana Leite na eleição para a nova Mesa Diretora do Conselho Municipal de Saúde de Campo Grande (CMS) é mais do que simbólica, é um recado direto: a população cansou de omissão, silêncio e maquiagem institucional. Pela primeira vez em anos, o comando do órgão que deveria fiscalizar a aplicação de bilhões de reais da saúde pública está nas mãos de usuários do SUS e trabalhadores da área, e não mais nas mãos do Palácio.
A tentativa da gestão municipal de manter o controle do Conselho, por meio da reeleição de Cleonice Alves, não só fracassou, como escancarou o desgaste político de uma administração que vê a crise da saúde pública sair do controle. Aliás, sob a presidência de Cleonice, o CMS ficou famoso por sua passividade, tanto que acabou na mira do Ministério Público, acusado de fechar os olhos para o colapso da rede municipal.
No plano B, a prefeitura apostou em Neiton Stradiotto, técnico da própria Sesau, que também não convenceu os conselheiros. Acabou encaixado na 1ª secretaria, isolado em uma Mesa onde os demais integrantes representam justamente quem mais sofre com o abandono da saúde pública: os usuários. Resultado: a prefeitura perdeu a cadeira e perdeu o discurso.
O novo coordenador, Jader Vasconcelos, e a coordenadora-adjunta, Maria Auxiliadora Fortunato, sinalizam o início de um CMS que promete cumprir o que a lei exige: fiscalizar, cobrar, controlar e, se necessário, denunciar. O tempo da conivência acabou. O tempo da planilha e do contrato sem questionamento virou passado.
E que não digam que o Conselho é figurativo. Só neste ano, a Prefeitura tem orçamento de R$ 6,8 bilhões. Se cumprir o mínimo constitucional de 15% na saúde, estamos falando de R$ 1 bilhão. Mas se, como diz Adriane em entrevistas, investe 27%, o valor sobe para mais de R$ 1,8 bilhão por ano — ou cerca de R$ 5 milhões por dia. Um orçamento robusto que, em tese, deveria garantir estrutura, remédio e dignidade aos usuários do SUS. Na prática? Faltam até seringas.
A composição anterior do CMS ignorou o caos, mesmo com hospitais colapsando, cirurgias suspensas, UPAs sem médicos e servidores exaustos. Agora, com a nova diretoria eleita contra a vontade da prefeita, o cerco à má gestão está oficialmente aberto. E o “recado” veio das bases: chega de conselheiros alinhados por conveniência política — o povo quer fiscalização, quer saber onde está indo cada centavo.
Adriane Lopes, acuada e sem maioria, amarga mais do que uma derrota no CMS. Amarga a constatação pública de que nem mesmo dentro da estrutura que ela mesma nomeia, há espaço para continuar fingindo que tudo vai bem. Se antes era possível controlar as decisões por meio de aliados, agora não. Agora, o Conselho virou trincheira de cobrança.
Resta saber se a prefeita, notoriamente avessa ao diálogo, aceitará conviver com um Conselho que funciona de verdade. Um Conselho que vai exigir respostas,
exigir números, exigir postura. A pergunta que ecoa é: será que Adriane está preparada para governar com o contraditório batendo à porta?
Enquanto a saúde pública de Campo Grande agoniza, pelo menos uma boa notícia: a omissão perdeu assento. E a esperança, finalmente, foi eleita.