Premiado pela demora da Justiça, Waldir Neves volta ao TCE

Dois anos, duas denúncias e uma tornozeleira depois, Waldir Neves está de volta ao cargo no Tribunal de Contas do Estado, de onde foi afastado por suspeita de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. Graças à lentidão cirúrgica do Superior Tribunal de Justiça, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu conceder habeas corpus ao conselheiro e mandou suspender o enfeite eletrônico que o acompanhava desde dezembro de 2022.

A justificativa? A já clássica “morosidade processual”. O ministro Francisco Falcão, relator no STJ, conseguiu a proeza de não pautar até hoje o julgamento da denúncia apresentada há mais de um ano pela Procuradoria-Geral da República. Enquanto isso, Waldir aguardava com tornozeleira no tornozelo e salário na conta — tudo em nome do devido processo legal.

Moraes reconheceu que não houve sequer pedido de inclusão do caso em pauta no STJ e que, apesar da “complexidade dos crimes”, não há sinal de reiteração delituosa. Ou seja, como ninguém mais foi flagrado vendendo julgamentos com o nome dele nas últimas semanas, o retorno ao cargo pareceu inofensivo.

Na prática, Waldir Neves volta a frequentar o TCE como se nada tivesse acontecido, exceto pelo detalhe das duas denúncias da PGR e uma investigação robusta da Polícia Federal. Como bônus, pode voltar a conversar com outros investigados, participar das mesmas sessões e analisar contas públicas com a autoridade de quem, até ontem, era vigiado por satélite.

As únicas medidas cautelares mantidas foram simbólicas: não sair da comarca, não sair do país e não renovar o passaporte. A julgar pela trajetória, o conselheiro não precisa cruzar fronteiras para fazer estrago. Aliás, o estrago está bem aqui, institucionalizado em toga e salário vitalício.

Enquanto a Justiça adia o julgamento indefinidamente, a decisão de Moraes escancara um sistema onde a lentidão beneficia réus com foro privilegiado e bons advogados. O cidadão comum que fique com o ônus da agilidade: para ele, prazo é prazo, tornozeleira é punição, e cargo público não é refúgio.

O mais irônico é que o retorno triunfal ao Tribunal de Contas acontece justamente sem que as contas de Waldir tenham sido devidamente analisadas. Os indícios são graves, mas o tempo é generoso. E como o Brasil não é para amadores, nada impede que o conselheiro volte a conselhar, inclusive sobre integridade e moralidade na administração pública.

Resta saber onde está a indignação institucional. Porque enquanto a sociedade assiste a esse teatro jurídico de camarote, os atores seguem circulando livremente nos bastidores do poder, agora sem tornozeleira, mas ainda sob o mesmo véu da impunidade.

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