Campo Grande no escuro e a Agereg no piloto automático

Foi uma cena digna de vergonha alheia. Durante o depoimento na CPI do Consórcio Guaicurus, o diretor-presidente da Agereg, José Mário Nunes da Silva, mostrou que não entende, não acompanha e, pior, não tem interesse nenhum em fiscalizar os contratos milionários que a Prefeitura de Campo Grande mantém com empresas concessionárias de serviços públicos essenciais. Sem saber responder às perguntas mais básicas, tentou justificar sua falta de preparo com os quatro meses de cargo. Mas o problema é muito maior — o problema tem nome e está no gabinete do Paço Municipal: Adriane Lopes.

A prefeita, que se esquiva das crises como se não fossem suas, é a principal responsável por colocar à frente da Agência Municipal de Regulação uma pessoa absolutamente alheia à função que ocupa. José Mário parecia um turista desavisado convocado a prestar esclarecimentos técnicos. Só que a Agereg não é um balcão de simpatia, é um órgão que deveria fiscalizar bilhões de reais em concessões de água, esgoto, lixo e transporte coletivo. Mas parece que, para Adriane, fiscalização é detalhe.

Durante quase três horas de sabatina, José Mário repetiu o repertório de “não sei”, “não foi comigo”, “entrei agora”, como se o cargo que ocupa fosse figurativo. A ironia se escancarou quando, no final da oitiva, revelou que tinha em mãos um relatório de auditoria sobre a frota de ônibus da Capital, um documento sigiloso até então, que apontava que 300 ônibus estão acima do limite prudencial de uso. Questionado se entregaria o material à CPI, respondeu que só mediante requerimento formal.

O absurdo foi tanto que vereadores chegaram a cogitar a apreensão do relatório. A vereadora Luiza Ribeiro resumiu bem: “Aqui foi um show de horrores”. José Mário, que passou a maior parte do tempo culpando os ex-diretores da Agereg e jogando a responsabilidade para outros órgãos, protagonizou uma cena que escancara a farsa da regulação municipal. Não fiscaliza, não exige, não pune. Apenas assina ofícios e cumpre agenda.

A agência reguladora se comporta como um cartório carimbador de contratos. Nada é exigido, nada é monitorado, nada é corrigido. E a prefeita? Silencia. Afinal, quem colocou José Mário lá foi ela, e não por acaso. A Agereg finge que fiscaliza, e a prefeitura finge que governa.

Adriane Lopes parece ter descoberto a fórmula da autodefesa: empurrar aliados para cargos-chave, blindar-se atrás da ignorância alheia e seguir distribuindo milhões em contratos sem se preocupar com o retorno à população. O presidente da Agereg não foi despreparado por conta própria, foi escolhido exatamente por isso. A ideia não é regular, é deixar correr solto.

A presidente da CPI deu 24 horas para o relatório ser entregue. A relatora, Ana Portela, deixou claro que a paciência está no fim. Mas o estrago já está feito. O depoimento de José Mário não foi apenas vergonhoso, foi a comprovação pública de que Campo Grande está largada, sem comando técnico, sem controle e, pior, sem respeito com o contribuinte.

No fim das contas, a Agereg virou um retrato perfeito da atual administração: muito discurso, nenhuma entrega. Um órgão que deveria proteger o interesse público, hoje serve apenas para legitimar a omissão de uma prefeita cada vez mais distante da realidade da cidade. Se a regulação está nas mãos de quem não sabe o que regular, o caos é só uma questão de tempo.

E Campo Grande, mais uma vez, é quem paga a conta, com tarifa alta, serviço ruim e uma prefeitura que, ao que tudo indica, tem medo de fiscalizar os próprios contratos.

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