Em mais um capítulo polêmico do Judiciário de Mato Grosso do Sul, a Cervejaria Petrópolis parece ter encontrado no poder de seus advogados, parentes de desembargadores, um passe livre para driblar suas obrigações fiscais. Com uma dívida acumulada de mais de R$ 1 bilhão em ICMS, a empresa está se valendo de conexões familiares influentes para manter uma isenção de impostos que, segundo o Governo do Estado, não deveria mais existir.
Tudo começou em 7 de abril de 2019, quando o Governo Estadual firmou um Termo de Acordo com a Cervejaria Petrópolis, comprometendo-se a conceder benefícios fiscais e tributários por quatro anos, em troca da construção de um centro de distribuição de bebidas em Campo Grande. A promessa, no entanto, nunca se concretizou. Em vez de cumprir o acordo, a Petrópolis limitou-se a atividades comerciais no Estado, sem investimentos produtivos ou geração de empregos locais — uma clara violação do que foi estabelecido.
Em dezembro de 2022, finalizou o benefício fiscal e a participação da cervejaria no programa MS Empreendedor. No entanto, a empresa, em vez de assumir suas obrigações, buscou a Justiça. E, para surpresa de muitos, conseguiu, por meio de uma liminar, manter os incentivos fiscais, amparada pelos advogados que, para muitos, parecem ter mais influência que argumentos jurídicos sólidos.
A Cervejaria Petrópolis, em sua defesa, alega ter firmado o acordo de benefícios fiscais em 17 de dezembro de 2012, com direito à isenção de ICMS até 2035. Na prática, isso significaria mais de uma década de isenção sem qualquer contraprestação produtiva. Ao alegar “direito adquirido”, a empresa espera continuar sem pagar impostos até 2035, algo que o Governo do Estado considera um verdadeiro escárnio contra os cofres públicos.
O Estado reforça que a concessão inicial dos benefícios se baseou na promessa de investimentos concretos, visando o desenvolvimento econômico regional, a geração de empregos e o aumento na arrecadação de ICMS. Com o não cumprimento desses compromissos, o Governo considera inadmissível que a Petrópolis continue a operar no Estado sem pagar tributos, representando um ônus direto para a população.
Diante do cancelamento administrativo dos benefícios, a Cervejaria Petrópolis não perdeu tempo: contratou uma equipe de advogados parentes de desembargadores. O resultado foi rápido e eficaz. Em um movimento que deixou o Estado surpreso, a empresa obteve uma liminar favorável, mantendo os benefícios fiscais. A decisão gerou reações indignadas, pois a suspeita de que laços familiares possam ter influenciado a Justiça é cada vez mais forte.
A situação tornou-se ainda mais delicada com as revelações da Polícia Federal, por meio da Operação Última Ratio, que expôs uma rede de venda de sentenças no Judiciário local. Esse escândalo indica que interesses privados estariam sendo sistematicamente favorecidos em detrimento do interesse público, com decisões favoráveis a grandes empresas que, como a Cervejaria Petrópolis, estariam utilizando recursos do Estado sem cumprir suas contrapartidas.
O Governo do Estado, que antes parecia travar uma “guerra perdida”, ganhou novo fôlego após as revelações da operação. Ainda assim, enfrenta obstáculos significativos para reverter a liminar. Para muitos, a decisão judicial que beneficia a Petrópolis se mostra insustentável do ponto de vista jurídico e moral, mas, na prática, o peso das influências parece prevalecer sobre o respeito à legislação e ao erário público.
O juiz da 1ª Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos, Paulo Roberto Cavassa de Almeida, que concedeu a liminar à cervejaria, determinou que a empresa continue sem pagar ICMS até 7 de janeiro de 2027. Com isso, o Judiciário estendeu a isenção de uma empresa que não gerou o desenvolvimento prometido, mas, ao contrário, acumula dívida bilionáriacom o Estado.
Essa situação gera indignação entre contribuintes e empresários locais que cumprem suas obrigações fiscais e veem com desconfiança o poder de influência de grandes empresas que se recusam a colaborar com o desenvolvimento de Mato Grosso do Sul. Ao persistir na cobrança da dívida, o Governo não só busca uma questão de justiça financeira, mas também tenta restaurar a credibilidade de um Judiciário que tem sido questionado em casos de interesse público.
A pergunta que fica é: Mato Grosso do Sul continuará sendo palco de um Judiciário que beneficia empresas influentes em prejuízo da sociedade? Enquanto o Governo Estadual e a sociedade aguardam por justiça, a Cervejaria Petrópolis, com o apoio de advogados influentes, permanece blindada das obrigações fiscais, escancarando uma realidade de desigualdade no tratamento tributário e reforçando a percepção de que, na Justiça, alguns têm mais privilégios do que outros.