Muito em breve Campo Grande vai saber se a Justiça Eleitoral continuará de joelhos ou se, finalmente, levantará a cabeça para dizer um sonoro “basta” aos abusos cometidos pela prefeita Adriane Lopes e sua vice, Camilla Nascimento. No último dia 26 de março, o Ministério Público Federal pediu a cassação dos mandatos da dupla e a decretação de suas inelegibilidades por oito anos. E não foi por falta de fé — foi por excesso de provas.
O parecer do MPF é categórico: houve compra de votos, sim senhor. Teve promessa de dinheiro, PIX comprovado, testemunhas confirmando a prática e até gente do gabinete da prefeita distribuindo recursos em nome da salvação eleitoral. Mas, até agora, nenhuma resposta final da Justiça. A pergunta que paira no ar é: quantos carimbos precisa uma ilegalidade para virar cassação?
Além da já clássica compra de votos, o Ministério Público aponta o uso descarado da máquina pública e da estrutura religiosa para fins eleitorais. Igrejas viraram palanques, cultos viraram comícios, e pastores viraram cabos eleitorais — devidamente recompensados com cargos comissionados. E tudo isso numa fé tão conveniente que Jesus, se passasse por aqui, talvez dissesse: “Dai a César o que é de César, e o resto à Adriane”.
Teve também o famigerado evento “Mulheres que Transformam”, realizado num templo evangélico, com toda a pompa de comício — e o recheio político da ala bolsonarista gospel. Lá estavam Michelle Bolsonaro, Damares Alves e a fina flor da bancada da Bíblia. O evento foi, segundo os autos, “um ato de campanha luxuoso com forte apelo religioso e político”. E a prefeita? Negou tudo. Disse que alugou o templo, como se o problema fosse só a nota fiscal.
O MPF também contesta a tese de que não houve pedido explícito de votos dentro das igrejas. Ora, como se a política da fé precisasse de cartaz e número de urna. Bastava estar na frente, de microfone na mão e a bênção do pastor. A mensagem era clara como água batismal: “não votem no ímpio”, como disse a própria Adriane em uma fala que certamente não passou por revisão jurídica.
E enquanto isso, a vice-prefeita Camilla, tão discreta quanto cúmplice, permanece ao lado da prefeita como quem reza para não ser notada. Mas o Ministério Público não deixou passar. Pediu cassação e inelegibilidade para as duas. Afinal, no altar do abuso de poder, quem comunga da prática, comunga da pena.
O mais curioso é que o pedido de cassação chega apenas agora, depois de a Justiça Eleitoral ter considerado, em primeira instância, que não havia prova suficiente da ligação direta das candidatas com os atos. Segundo essa lógica, se o crime acontece no quintal, mas o dono da casa jura que estava na sala, tudo bem. Ainda que o quintal seja financiado com dinheiro público.
A população de Campo Grande agora assiste ao desfecho desse capítulo com a expectativa de quem sabe que, se a Justiça quiser, pode — e deve — agir. O que está em jogo não é apenas um mandato. É o respeito à democracia, à laicidade do Estado e à mínima decência no uso do poder.
O parecer está na mesa. As provas estão nos autos. E a paciência da população, essa sim, está no limite. Resta saber se o TRE-MS dirá o “amém” da impunidade ou se, dessa vez, fará o milagre da moralidade pública acontecer. Porque se nem com fé, dinheiro e fraude se cassa alguém, então para quê serve a Justiça Eleitoral?